terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Inútil tentativa de fuga

Era quase manhã, quando subi na aeronave. Lindo ver o nascer do sol lá do céu. Parecia filme. Mas era eu ali, apreciando um dos momentos mais sublimes da terra, em talvez a melhor hora que exista. Adormeci. Em paz, mesmo estando tão distante do chão.

Minha ida a Belo Horizonte é apenas um final de semana “alongado”. Mas é o “viajar” que me importa.

Depois de aterrissar, pés no chão, olhos na realidade. E, em BH, essa realidade vem acompanhada de um ventinho sutil, uma brisa, que me marcou desde que fui para lá pela primeira vez.

Lá, tenho a sensação de que fui engolida por algo simplesmente gigantesco. Sinto-me uma formiguinha, em meio a outras, sob aquele solzão. Novamente, estava eu lá.

Pessoas e coisas distintas aos meus olhos. Ar diferente, pessoas diferentes – com características fortes: sotaque, gírias, cor e feição.

Na semana da viagem, eu estava muito cansada da minha rotina do trabalho. Da rotina do ir e vir pra casa, depois de trabalhar o resto do dia. Precisava me refugiar em outro lugar, descansar, esquecer que existia fome e dor na terra. Pensar somente em mim, e me divertir como se fosse meu último dia.

Porém, só percebi que o que eu realmente precisava não era de férias. Nem de folga. Mas de uma fuga.

No começo, pensei que conseguira. Fugi do meu estado, da minha cidade, do meu bairro, da minha casa e da família. Mas não de mim. Não há como fugir de si mesmo.

Se estamos sofrendo algum tipo de aflição. Se não estamos de bem com a gente mesmo, não importa para onde formos, tudo vai junto conosco. Para onde for. Não há para onde fugir de nós mesmos.

E aí, então, em pé, na sacada do apartamento da zona norte de BH, que fiquei por muito tempo refletindo sobre isso, foi quando enxerguei que não estava totalmente realizada e feliz. Pois tudo que me afligia estava ali, comigo. Porque não posso fugir da minha realidade. Não por mais tempo que dura um porre. No outro dia, eles estarão todos ali, os problemas, os medos, as angústias, novamente. Só que com mais aquela dorzinha de cabeça indesejável, da cachaça.

O que eu queria, de verdade, naqueles poucos dias em que estive lá era andar nas ruas e não ser reconhecida, ou, melhor dizendo, não avistar nenhum rosto conhecido na multidão; era fingir que ali eu era uma nova pessoa, ausente de todos os meus erros passados; recomeçar – a cada novo amanhecer –, uma nova vida. Fingir que minha casa, e todos que amo não estavam lá para me esperar. Porque eu queria estar livre nem que fosse para morrer.

Estive lá, por alguns dias, e aqui, ao mesmo tempo. Corpo lá, e em algumas vezes, a cabeça aqui, na minha vidinha de todo dia. E em algumas outras vezes, totalmente lá, sem pensar que quando retornasse tudo estaria a me esperar: contas para pagar, trabalho no dia seguinte, os ônibus lotados...

Mas, como todo turista, ou quase todos, amei voltar para minha casa, minhas coisas. Amei deitar sobre minha cama gostosa. Sentir o cheiro do cachorro e do meu travesseiro.

Da viagem, as lembranças dos passeios e das pessoas que dividiram comigo aqueles dias e noites ficarão guardadas em mim. De BH, a recordação visual da cidade de subidas e descidas enormes. De casinhas pequenas com janelas estreitas, de cimento ou de tijolo à vista. Dos telhados e suas caixas d’água. Do colorido das pipas enroladas nos fios elétricos, lúdico e singelo. Simples, como o povo mineiro. Fechado, pouco simpático, a meu ver, mas simples e humilde.

Era o que eu precisava para me entender.

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