quinta-feira, 28 de maio de 2009


Dieta familiar

A cervejada e a comilança estavam fazendo a festa lá em casa; temporada de casa cheia, a mãe vindo do interior para fazer exames na capital.
O frio rasgando os lábios e uma certa falta de vontade de sair de casa.
A programação era ficar em casa vendo filmes e comendo. Jogando videogame e comendo. Brincando com os cachorros e comendo. Ouvindo músicas enrolados em edredons e comendo. Sempre acompanhado de uma boa cervejinha para dar aquele ânimo para um início de inverno massacrante.
Em poucos dias todos foram notando-se arrendondandos. Notava-se uma certa perturbação em função de estarmos nos sentindo pesados e inchados. Mas ainda felizes com as comilanças e as bebedeiras.
Até que um dia, um domingo chato e regado de tudo de bom para comer e beber, eu tive uma ideia que acabei compartilhando com todos e que transformou num inferno a minha vida.
Disse que faria uma dieta para perder uns kilos. E que só tomaria cerveja aos finais de semana. Todos acharam a ideia ótima e de repente, sem que eu pudesse controlar, aquilo já era regra para todos dentro de casa.
Sim! E ao ponto de cada um cobrar do outro os excessos cometidos.
Quando me vi, estava cercada de policiais prontos a me coibir e punir com uma falha na dieta.
Os pães eram contados e bebidas só lights.
Fazia apenas dois dias que estava naquela situação limitada de meus prazeres, quando resolvi burlar um pouco a regra da casa.
Comprei uma lata, uma mísera latinha de cerveja, para tentar dar mais brilho àquele resto de dia e começo de noite chato e cansativo. Mas vi no olhar da Fernanda uma reprovação que me deu um nó na garganta ao ponto de quase impedir o líquido a adentrar minha goela. Golpe baixo dela.
Para piorar a situação, nesta mesma noite, a qual me sentia culpada e traidora da família, bate-me à porta meu vizinho para pedir algo. Ele e a esposa têm um cachorro da raça Labrador que mais parece um leitão. Eu tinha certeza de que o cão pesava uns 100 kilos, sim, ele parecia pesar isso.
E resolvi, naquela visita inesperada, lhe perguntar para confirmar. Ao que tive a surpresa que me finalizou como um golpe fatal numa luta de vale-tudo.
Ele disse-me que o seu cão pesava apenas 40 kilos. 40 kilos? Duvidei. Ele manteve sua posição. Naquele momento, eu já encarava aquilo como uma agressão. Ele me deu um tapa na cara sem piedade.
Eu, passando dos 50 e aquele "búfalo" com 40?! Ah...
Fechei a porta derrotada. Fernanda só me olhava, querendo rir e ver minha desgraça, claro, afinal, eu estava arruinando a dieta de toda uma família.
No outro dia, falei pela internet com a Ângela, na esperança de que ela me doasse palavras confortantes. E me abri. Disse que não aguentava mais aquele regime militar alimentar.
Foi então que lhe contei o ponto a que cheguei com essa repressão.
"Estava anoitecendo, eu eu acabara de chegar em casa do trabalho. Mãe no quarto, mano no seu, e Fernanda me olha e diz: Bah, que vontade de tomar uma cervejinha hoje!
Mas não pode! Logo pensei. Ela estava noite passada me fuzilando com os olhos e agora estava com aquela malícia nos olhos, me induzindo a pensamentos que iam contra o regime familiar. Eu devolvi o mesmo olhar, que logo se realizou numa trama calculada cuidadosamente com sabor de 'errado'.
Dissemos a todos que iríamos sair para locarmos uns filmes em DVD. Todos acreditaram. Saimos e compramos no boteco da frente umas latas e, como duas adolescentes, fomos tomando pela rua, enquanto olhávamos para os lados para nos reafirmarmos de que não estávamos sendo seguidas. Ríamos de nossa situação infantil, mas não sentíamos arrependimento. Aquilo nos parecia com 'liberdade'."
Ângela disse que o cão não pesaria apenas 40 kilos, o que me deixou mais crente ainda de que eu estava certa em duvidar daquele dado. Fiquei mais confiante. Ângela disse mais, que estava com dó da minha situação. E se ofereceu para ajudar no que fosse preciso.
Eu disse a ela que queria o fim daquele tratamento militar que estava por me tirar a graça de viver, e que estava com coragem de fazer um motim, armar uma rebelião.
Ângela disse que me ajudaria. Que em poucos minutos, se eu quisesse, ela estaria na porta do meu apartamento com cartazes e um megafone, aos gritos: "Liberdade, liberdade." "Não queremos mais sopinha, queremos é cevinha". "Chega de regime alimentar, queremos é nos embebedar".
Achei que aquilo seria um golpe muito forte. E optei por não fazê-lo. Foi uma decisão difícil, confesso que quase cedi, mas meus laços familiares foram mais fortes. Minha mãe poderia não resistir a uma paulada daquela.
Pus meu rabinho por dentre as pernas e engoli em seco. Arrumei minhas coisas e fui para casa. No caminho, refleti sobre tudo. Era quarta-feira e haveria jogo na televisão. Pensei comigo: "Mas hoje meu time jogará! Como não beberei pelo menos uma mísera cerveja?".
Telefonei para casa e comuniquei a todos: "A partir de agora, cerveja só no final de semana, e nas quartas-feiras, quando tiver jogo. Fernanda, bote umas pra gelar, tenha dó".
Ninguém se opôs.
Já faz quase uma semana que entrei nessa e nada de resultados.
Sou imediatista, quero ver meu corpo magro e esbelto de antes! Ângela me esclareceu o que eu já sabia: os resultaos só aperecem em dois meses!
Ouvir aquilo foi como levar um soco na boca.
Eu estava perdendo o controle. E tudo só daria certo se eu cumprisse com a dieta direitinho, ou seja, ao pé da letra. Não sabia mais se poderia fazer aquilo.
Mas a dieta segue, meio capenga, porém em pé.
Que buda me ajude e me dê a força necessária para poder concluir os 2 meses.
Tá difícil!

Sinara Dutra